domingo, setembro 26, 2010

Tropa de Elite 2: roteiro, efeitos especiais e montagem

Wagner Moura (Nascimento)
Crédito: Alexandre Lima
José Padilha fez em Ônibus 174 um dos melhores documentários brasileiros dos últimos tempos. Em verdade, na minha opinião, apenas um filme o supera no mesmo gênero, Santiago (2007), de João Moreira Salles, em si mesmo uma aula de fazer e pensar documentário, uma lição de cinema. Em Ônibus 174, vemos a estrutura de um documentário fundado em forte pesquisa temática e de personagem (central e periféricos). O dedo apontado para nós, sociedade, ao final do filme continua em Tropa de Elite, este um filme que, juntamente com Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles, trouxe uma ruptura com o filme brasileiro de ficção feito anteriormente. Por meio da montagem, do ótimo trabalho no roteiro e da nova direção de atores, as duas obras foram responsáveis por propor novo ritmo ao cinema nacional ficcional.

Em Tropa de Elite 2, o inimigo agora é outro, a tendência é seguir o mesmo caminho de sucesso alcançado pelo primeiro filme da série, vide a equipe que o compõe.


Pesquisa e Roteiro
O trabalho de pesquisa, que teve como consultores Rodrigo Pimentel, o deputado estadual Marcelo Freixo e a delegacia comandada pelo delegado Cláudio Ferraz, foi realizado por quase dois anos antes de o roteiro do roteirista Braulio Mantovani e do diretor José Padilha ganhar forma. Ambos construíram uma história atual, baseada em fatos reais que se misturam a história fictícia de Nascimento (Wagner Moura), da sua família, e de seus amigos, para falar da realidade do Brasil no cinema. O protagonista, agora dez anos mais velho, cresce na carreira: passa a ser comandante geral do BOPE, e depois Sub Secretário de Inteligência. Em suas novas funções, Nascimento faz o BOPE crescer e coloca o tráfico de drogas de joelhos, mas não percebe que ao fazê-lo, está ajudando aos seus verdadeiros inimigos: policiais e políticos corruptos, com interesses eleitoreiros. Agora, os inimigos de Nascimento, são bem mais perigosos.

Em Tropa 2 o principal arco dramático do filme, que no primeiro Tropa foi de Mathias (André Ramiro), será de Nascimento. Como o próprio Nascimento diz em Tropa 2, "agora é pessoal".

Bráulio Mantovani entrou em Tropa de Elite já com o primeiro tratamento do roteiro pronto, como consultor, script doctor, e acabou mudando o foco narrativo do filme na sala de montagem ao lado do diretor José Padilha e do editor Daniel Rezende. A ousadia realizada sem regravação de cena, apenas com offs reescritos, transformou o personagem secundário em protagonista. O feito, “uma loucura, que beirava o impossível”, como dizia na época, acabou fazendo de Tropa 2 “quase uma obrigação”. “Tropa era para o Mathias (André Ramiro), mas o Wagner (Moura) roubou o filme. O Nascimento era mais um narrador. Foi o Wagner que fez a gente descobri-lo. Agora sim, vamos explorar todas as contradições dele a fundo e levá-lo aos seus limites”, diz. “Tropa 2 é um mergulho nas contradições do Nascimento. É a descida dele aos infernos”, completa. Fora a “obrigação”, a ideia de trabalhar o problema das milícias, outro assunto nunca tocado no cinema, segundo Mantovani, foi um presente. “As milícias são fenômenos tão recentes que os personagens precisavam envelhecer para poder lidar com eles. Tivemos que atualizar o tempo para que isso pudesse ser cronologicamente crível”, explica.“Durante um ano mais ou menos, fizemos cinco versões diferentes do roteiro. Tentamos vários caminhos. Numa parceria muito próxima com o Padilha e onde muitos participaram: Daniel Rezende, Marcos Prado, Wagner Moura...”, diz.

Paulista, formado em Língua e Literatura Portuguesa e pós-graduado em Roteiro Cinematográfico pela Universidade de Madri, Mantovani começou como roteirista de longa-metragem já indicado ao Oscar por Cidade de Deus, fruto de uma parceria iniciada em sua estréia como roteirista no curta Palace II (2001), de Fernando Meirelles. Já a dobradinha com José Padilha começou quando Mantovani escrevia o roteiro para a versão ficcional do documentário Ônibus 174, o filme Última Parada 174, de Bruno Barreto. “O Zé (Padilha) foi um verdadeiro produtor criativo, me ajudou muito no roteiro”, diz. A sintonia evoluiu com Tropa. “Aprendi com o Bráulio que eu não sabia escrever. Achava que sabia, mas levava três meses fazendo um tratamento que o Bráulio faz, muito melhor, em duas semanas”, dizia Padilha, na época do lançamento do primeiro Tropa.

Em Tropa 2 a proximidade, em especial com Padilha e Daniel Rezende, com quem trabalhou ainda em Cidade de Deus e O ano em que meus pais saíram de férias (2006), de Cao Hamburger, rendeu boas trocas. Montavani participou durante três dias da montagem. “Só visito a montagem, detesto ‘set’, acho chato, já estive muito” - antes de assinar roteiros, Mantovani trabalhou como assistente de direção e câmera e escreveu para teatro - “sinto que não tenho como ajudar, interagir, ali. Já na montagem e nos ensaios, sim. Não participei dos ensaios de Tropa 2 por impossibilidade de tempo. Mas nos ensaios dá para perceber o que funciona e o que não ainda dá tempo de alterar. E na montagem podemos mudar até o foco narrativo (ri).”

Apontado como um dos melhores construtores de diálogos hoje no ofício do roteiro no país, Mantovani desconversa.“Quase todas as frases de Tropa que viraram bordões saíram dos ensaios, da interação com o pessoal do BOPE. O que faz uma fala ter repercussão é a maneira, o carisma, como o ator diz o texto”, afirma. Mas se contestado, ele acaba reconhecendo algum mérito seu: “Claro que cada cena tem que estar muito bem escrita, tudo muito bem encadeado, para que os improvisos, o carisma, as sintonias aconteçam.”

Perguntado se costuma andar com caderninhos em busca de inspiração, responde: “Quando escuto coisas que gosto, guardo na memória e uso depois, mas não tenho o hábito de anotar frases de forma sistemática”. E afirma: “Eu não me levo muito a sério. É tudo rock’nroll (ri).”


Efeitos Especiais e outros
Uma equipe de efeitos especiais, com nomes como Bruno Van Zeebroek, de Transformers, William Boggs, de Homem-aranha, e Keith Woulard, de O Curioso Caso de Benjamin Button, Independence Day e Forrest Gump, trabalhou no set de Tropa 2. O presídio de Bangu 1 foi reconstruído em seus mínimos detalhes num estúdio de mil metros quadrados, consumindo cerca de 15% do orçamento. Corpos carbonizados foram criados pelo mestre da maquiagem Martin Trujillo. Câmeras foram penduradas em cordas para dar maior proximidade e ineditismo à marcante fotografia de Lula Carvalho. Um andar inteiro de um edifício na Av. Presidente Vargas, centro do Rio, voltou a ser sede da Secretaria de Segurança Pública do Estado.


Montagem
“A estética de Tropa 2 - presente na edição - espelha a idade, o momento, dos personagens”, diz Daniel Rezende. “Nosso maior medo era fazer mais duas horas do primeiro filme. Tropa 2 tem uma pegada diferente. O considero mais adulto. O primeiro tem uma energia visceral. Muito da descoberta. O segundo vai para os bastidores, para a política, sem perder a ação, a agilidade, a brutalidade do BOPE, o universo pop no qual Tropa está inserido. Mas tem menos música comprada. Tem menos off de narração. Mais tempo de silêncio. É tensão pura, tem cenas catárticas, mas dentro de um espírito mais maduro. Tropa 2 já nasce pop por natureza. Não precisa reforçar isso”, diz.

O editor, contrariando cânones cinematográficos, participou de todas as filmagens de Tropa 2, como diretor de segunda unidade.“Nunca tinha trabalhado assim. Só tinha ido em refilmagem já montando. Existe uma facção que diz que o montador nunca deve ir ao set, porque é bom manter o olhar fresco, mais próximo do espectador. Mas aprendi muito. Montador sempre se pergunta porque não filmaram isso ou aquilo. Para ele, parece óbvio, mas no set você entende porque aquilo que, às vezes, você mais precisa não foi feito. O Zé (Padilha) me chamou ainda na pré-produção. Pensamos juntos desde o início.E ganhamos em acerto e rapidez”, diz.

Tropa 2 levou três meses e meio em edição, quando normalmente um filme desse porte leva cerca de sete, o
dobro. “O Zé fazia no papel onde estariam as câmeras, para saber se estávamos cobrindo tudo. Eu, às vezes, indicava um lugar para cortar, como num close. Temos muitos planos sequência, então ia assistindo ao ‘take’ rolando e já pensando que trecho poderia usar. O Renato Martins, montador associado, ia preparando o primeiro corte de cada cena, baseado na minha conversa com o Zé. Muitas vezes, depois da filmagem passava na ilha e direcionava o que ele tinha feito. Quando fui de fato editar, já tinha boa parte do trabalho feito”, explica.

Sobre como resolveu na montagem as muitas idas e voltas no tempo do filme, Rezende responde: “ele parece que vai e volta, mas não é tão assim”. “Atribuem sempre o mérito de ir e voltar no tempo, sem perda de ritmo ou entendimento, à montagem, mas se não funciona é porque no roteiro não estava bem construído”, diz. O elogio endereçado ao roteirista Bráulio Mantovani exprime uma parceria sólida. “Se pudesse só trabalhava com ele. O montador é o olho mais cru. Mas depois de estar ali na ilha há meses, ele vicia. Ter o Bráulio, que vem lá de trás, nessa hora, ajuda muito”, diz. 

**Foto, entrevistas e dados de produção extraídos do press book distribuído pela assessoria de imprensa do filme, Belém Com, http://www.belemcom.com.br/

Mais informações:

quinta-feira, setembro 23, 2010

Filme ruim abre Festival do Rio 2010

A Suprema Felicidade, de Arnaldo Jabor, selecionado para abrir o Festival do Rio 2010, é uma grande decepção frente a alguns dos ótimos trabalhos realizados pelo diretor no passado. Fazendo distorcida referência a filmes de Federico Fellini e outros diretores, a citação acaba por soar como pretensão quando comparada às obras dos grandes mestres do cinema. A péssima direção de atores os leva a uma interpretação artificial, forçada e desprovida de sentimento. O roteiro é ruim, com diálogos não convincentes e situações inverossímeis. Os personagens falam palavrões e usam gírias atuais em pleno pós-guerra, anos 40/50, tempo em que os valores eram outros. A obscenidade e por vezes o nu e o sexo aparecem de modo incisivo, o que se destaca pela inadequação a uma época em que a sociedade brasileira era ultraconservadora. Em meio a tudo isso, também somos incomodados pela péssima voz da atriz principal, que canta desafinadamente. Enfim, uma lástima que tal filme tenha sido selecionado para abrir o Festival do Rio deste ano.
Se não bastasse, acabo de ler nos jornais que 'Lula, o Filho do Brasil', de Fábio Barreto, foi indicado como o representante nacional para concorrer ao Oscar 2011, uma notícia no mínimo desconfortável. O Brasil virou um lugar estranho para a liberdade e a criação.

Curb Your Enthusiasm – A Reinvenção do Sitcom

  Curb Your Enthusiasm é um dos mais brilhantes sitcoms da televisão norte-americana depois de Seinfeld . O criador de ambos, Larry David...